Relato de Guanajuato – Projeto Magdalena no México
Participamos os três - Marisa, Monica e Roberto - do evento Sete Caminhos Teatrais, que este ano foi dedicado ao Projeto Magdalena (é a primeira edição mexicana). Por conta disso passamos dez dias, de 8 a 18 de julho, em Guanajuato, no México.
Prometemos a nós mesmas que durante o evento iríamos dedicar tempo para escrever pequenos relatórios (impressões) e compartilhá-los via web. Doce ilusão... afinal, onde encontrar tempo em meio a um turbilhão de atividades que preenchem manhã, tarde e noite? Além dos workshops, palestras e espetáculos, vale ressaltar, e muito, os encontros nos corredores, nas mesas do café da manhã, almoço, janta, e também as conversas de bar, após os espetáculos, regadas seja a água, suco, cerveja, vinho, ou tequila.
Passados 3 dias do festival, ainda estamos um tanto reflexivos diante de toda a experiência vivenciada. E muitas coisas estão por ser digeridas ainda. Podemos dizer que o choque cultural foi grande, em todos os aspectos, inclusive o gastronômico. Mas, para não adiar mais nossa promessa acerca dos relatos, deixamos aqui uma pequena nota sobre nossa viagem:
Guanajuato é uma cidade linda, de origem pré-colombiana, localizada no centro do país, e, além de ser referência cultural nacional, é um importante centro universitário. A cidade fascina pela profusão de cores, pelas ruas tortuosas e labirínticas calçadas com pedras, pelas construções arquitetônicas coloniais, pelo patrimônio histórico preservado, pelos túneis que cortam a cidade (herança do passado de minério). Logo na entrada da cidade, fomos surpreendidos por uma placa sugestiva: zona dos teatros. E nos pusemos a imaginar o que iria acontecer por ali nos dias seguintes.
Participamos com o espetáculo “Somático” e uma palestra. E fizemos contatos visando à realização do Vértice 2012, além de muitas novas amizades. O encontro reuniu mulheres – e homens - de vários países: País de Gales, Dinamarca, Singapura, Brasil, Itália, Colômbia, Estados Unidos, Espanha, México e Japão.
Cada espetáculo, cada palestra, cada experiência compartilhada, parecia renovar – de formas muito distintas – o desejo e a necessidade de que o teatro provoque de forma efetiva alguma transformação. Transformação da realidade, do indivíduo, do olhar...
Um festival dedicado à produção de mulheres sempre proporciona um misto de sensações difícil de ser encontrado em outras partes: rigor, generosidade, disciplina, compaixão. E também muita disposição e alegria em toda parte. A começar pela coordenadora do evento, Amaranta Jeito, mexicana radicada na Espanha, de pai colombiano, que trabalhava com entusiasmo impressionante enquanto carregava sua bela barriga grávida de seis meses.
Nesta foto: Roberto, Monica, Marisa e Amaranta Jeito. |
Estar em um projeto Magdalena no México foi especialmente impactante por causa da violência que permeia o cotidiano das mulheres deste país, especialmente as que vivem na fronteira entre México e EUA. A violência toma conta das ruas. Jovens de outros estados não podem viajar de carro porque há sequestros por toda parte nas estradas. O narcotráfico faz vítimas nas fronteiras a cada segundo e as mulheres são as escolhidas a dedo, sempre. Talvez por isso, os espetáculos, em sua maioria, denunciam, resistem, provocam, expõem mazelas pessoais e coletivas. Atores e público se desnudam revelando suas vulnerabilidades e angústias. A potência dessas produções parece estar na necessidade urgente de se fazer algo. É impossível não se comover.
A temática da violência sofrida por mulheres estava presente em muitos dos espetáculos realizados por companhias mexicanas, e por conta disso o festival foi permeado por discussões calorosas acerca do(s) feminismo(s) (pensado nos dias de hoje) e das necessidades e implicações de um festival de teatro de mulheres.
Para pensar tais questões foi muito importante a presença das fundadoras do The Magdalena Project, para nos relembrar suas inquietações iniciais que motivaram a criação do projeto. Jill Greenhalgh nos falou de sua raiva por ser silenciada enquanto mulher e artista. Julia Varley nos falou de teatro, e de que não se trata de dizer algo, mas sim de dar a possibilidade para a experiência.
E Patricia Ariza, em sua palestra, falou que o feminismo lhe ensinou algo muito importante: o privado é político.
Reunião de encerramento do 7 Caminos Teatrales |
Voltamos para casa com a cabeça fervendo e o coração inquieto, com muitas perguntas e o desejo de dar continuidade ao nosso trabalho. São muitas as anotações feitas no caderno; frases capturadas em meio a histórias de vida contadas por mulheres artistas; devaneios e perguntas misturados a garatujas e palavras soltas. No meio dessa confusão motivadora, seguimos nossos caminhos:
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